Por Paula Andrade
Publicado após sua morte em 2024, “Em agosto nos vemos” apesar de ser uma obra inacabada, marca o retorno do estilo lírico e cheio de simbolismos tão marcantes do querido Gabo.
A publicação desse livro é recheada de “polêmica” e um contexto um tanto quanto delicado: um manuscrito inacabado, a perda de memória de um dos maiores autores do século XX, um pedido do próprio Gabo para que não fosse publicado, pois na sua opinião não era um bom livro ou com suas próprias palavras: “Este livro não presta. Tem que ser destruído. ” Mas graças ao bom Deus, seus filhos após dez anos de sua partida resolveram dividir um presente com o mundo e publicar a última obra de Gabriel Garcia Márquez, o Nobel de Literatura.
Ana Magdalena Bach, com seus “olhos dourados, a virtude das poucas palavras e a inteligência para controlar seu temperamento”, herda essas particularidades de sua mãe, influenciando suas ações e decisões ao longo do livro, nossa protagonista é uma mulher casada, mas que todos os anos no dia 16 de agosto, viaja sozinha para uma ilha no Caribe para visitar o túmulo de sua mãe. As visitas à ilha não são apenas um tributo à mãe, mas possuem um significado muito mais profundo, representam momentos de introspecção, uma fuga de sua realidade e sua vida cotidiana. Permitindo-se experimentar aventuras amorosas, vivenciando uma nova identidade longe da pressão e responsabilidade que sua vida diária lhe exige. Nesse ritual Ana reflete sobre sua vida, seu casamento e suas escolhas.
Um dos temas que mais se destaca no livro é a busca por identidade através da fuga, ou seja, uma válvula de escape das expectativas e pressões na sua vida cotidiana, revelando assim sua sensualidade madura, complexa e silenciosa.
A ilha simboliza um estado de transição entre o passado e o presente; um lugar onde ela revive memórias ao visitar o túmulo de sua mãe e vive novas histórias a cada novo agosto. Durante suas visitas à ilha, a música e a literatura se tramam na vida de Ana. Seus encontros amorosos são embalados por boleros e valsas, criando um clima de romance e melancolia.
Outro tema nesta obra é a solidão. Em sua vida cotidiana Ana se sente só e isolada e ao buscar na ilha conexões significativas, só revelam essa solidão intrínseca que a personagem vive. A relação com sua mãe, é uma força motriz em sua vida, deixando claro como os laços familiares podem ser complexos.
Em agosto nos vemos é uma leitura encantadora e profundamente humana, rica em camadas emocionais e reflexões sobre a vida. Através de Ana Magdalena, Gabriel nos convida a refletir sobre nós mesmos, as relações familiares a até como lidamos com as perdas ao longo da vida.
Apesar de uma obra inacabada, vale a leitura, especialmente se você ama e é fã da escrita de G. Garcia Márquez. Para os fãs, esse é um presente agridoce, talvez imperfeito por não ser completo, mas carregada de poesia, sensualidade e humanidade, traços esses tão característicos do querido Gabo.
O livro é delicado, lírico e mesmo incompleto, tem o charme das últimas palavras. É uma despedida não oficial, discreta, suave, como uma carta deixada sobre a mesa. E talvez, por isso, carregue algo de eterno: o desejo, o luto, o tempo… tudo isso continua ecoando, agosto após agosto.